Desde
que comecei a escrever para o Sopa de Cérebro, tenho vontade de falar sobre
este filme, mas nunca me senti arduamente preparado para tal missão. Por que? É
simples. Kubrick, por si só, já é uma figura enigmática e que emprega sub textos
em seus filmes de maneira brilhante, quase sempre pouco perceptíveis, ou que
abra um leque de discussões sobre suas obras, afinal, ele nunca mastiga o que
quer para nós. Essa característica do diretor atinge seu auge aqui, quando até
hoje, passados 45 anos de seu lançamento,
continua sendo uma obra de ficção científica atual e discutida, pois nenhuma
das interpretações que rolaram até hoje, por mais plausíveis que possam
parecer, podem ser consideradas “A” certa.
O
filme é completo, pensado, perfeito, e até essa lentidão soa como proposital
aos olhos dos mais filosóficos, afinal, no espaço, os movimentos parecem ser em
câmera lenta.
Todo
o trabalho técnico do filme é espetacular. A começar pelos efeitos visuais que
nos dão à sensação de estarmos realmente explorando o espaço, quando na verdade
o filme foi feito em estúdios. O trabalho se torna ainda mais espetacular se
pensarmos que em 1968 o homem ainda não tinha realizado este feito. Kubrick
criou todo aquele universo somente com sua imaginação.
Através
dos movimentos da nave e das pessoas fora da gravidade e da visão da Terra sob
o ponto de vista de uma nave espacial, ali podemos ter a exata noção da precisa
visão que ele tinha do espaço.
Como
não se fascinar, por exemplo, pela bela rotação que a moça dá em certo ponto do
filme, saindo de cabeça para baixo pela porta lateral? E a caneta flutuante? E
a sala gigante de exercícios, construída para ser rotacional e, em certo
momento, Kubrick passeia com sua câmera por ela como se ela fosse plana e
estática? E o que dizer da maior elipse da história do cinema, quando partimos
da pré-história para o século XXI?
As
atuações de todo o elenco são muito competentes. Com expressões sempre sérias e
focadas, eles transmitem com sucesso ao espectador a importância da missão em
que estão envolvidos. Keir Dullea é o grande destaque como o inteligente David
Bowman. Preste atenção na cena em que ele tenta recuperar um colega perdido no
espaço. Seu movimento brusco dos ombros pra cima e pra baixo demonstra a
respiração ofegante e a tensão que ele está vivendo naquele momento. Gary
Lockwood também tem boa atuação como Frank Poole, o parceiro de David. Observe
como os dois conseguem transmitir através do tom de voz a preocupação eminente
de ambos com as respostas do computador Hall 9000 às perguntas que eles fazem.
Quando
a obra termina, claro, muito se observa. Há quem não entenda nada, há quem diga
que entendeu tudo, há quem discorde, concorde, questione, ame, odeie ou
considere-o um excelente resumo do atual estágio da inteligência da vida humana.
Resultarão,
por fim, diversas interpretações sobre a obra que tenta interpretá-lo. Nessa
instabilidade sobre uma conclusão e definição única da obra de Kubrick, todos
poderão considerá-lo uma viagem, em qualquer sentido, mas que propõe e atinge
com excelência seu interesse original: enaltecendo o pensamento, a
interpretação, a imaginação. Aliás, quando da elaboração do livro escrito por
Stanley Kubrick e Arthur C. Clarke, tudo já se resumia no pensamento de seus
autores, afirmando que “se algum dia alguém disser que entendeu o significado e
a obra por completo, nós fracassamos”.
Enfim, um clássico do cinema que deve ser visto e revisto inúmeras vezes. Não pensem que nostalgia, é uma constatação. Os filmes antigos são extremamente melhores que os de hoje. Fica a dica.
*Leandro Aguilar